Vital Moreira fala do conservadorismo de (certa) esquerda, em A Aba da Causa, no que respeita à apreciação que faz da actuação do Governo de José Sócrates. Como é habitual, é um apontamento exemplar. Cruza com notas deste blogue (e.g., sob a etiqueta saúde). Um excerto para animar à leitura de toda a coluna (o bold é meu):
"Recorde-se que na reforma da segurança social, enquanto o PS fez vingar a
reafirmação e as condições de sustentação do modelo de segurança social pública,
universal e geral, a direita insistiu num modelo de capitalização individual das
pensões, o qual, além de abandonar qualquer ideia de solidariedade social e
intergeracional, necessitava de um gigantesco endividamento público para
suportar os encargos das pensões nas próximas décadas, dada a cessação das
contribuições para o fundo geral da segurança social."
"No caso da educação e da saúde, os projectos da direita não podem ser mais
claros. Como se exprimiu enfaticamente o líder do PSD, trata-se de "desmantelar
o Estado" - com o Estado social à cabeça, bem entendido - ou, nas palavras de
Manuela Ferreira Leite, de "afastar o Estado" da saúde e da educação. Mesmo que
se proteste que pode haver garantia dos direitos sociais sem passar pela sua
prestação pública - o que é verdadeiro, em abstracto -, a verdade é que não pode
haver grande ilusões de que nas actuais circunstâncias nacionais a privatização
dos serviços públicos de segurança social, de educação e de saúde, transformando
o Estado em simples pagador da sua prestação privada a quem não tivesse meios
para os pagar, produziria uma inaceitável segmentação social, entre os serviços
"de primeira" para quem pode pagar e os serviços "de segunda" (ou "terceira")
para quem depende da subvenção estatal."
"Por conseguinte, enganam-se deliberadamente os que não querem ver que a
alternativa à política de modernização e racionalização dos serviços sociais
públicos não consiste em insistir no modelo tradicional (e caminhar para o seu
inevitável colapso a médio prazo), como quer a esquerda conservadora, mas sim em
seguir as receitas da direita, suprimindo a responsabilidade colectiva por
serviços públicos universais e substituindo-a, quando muito, pela garantia
supletiva de "serviços mínimos" para quem não possa pagar a sua prestação
privada. A opção (de esquerda) devia ser óbvia."
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