26 de março de 2008

Educação em Portugal (X)


Isto vai sobre sob a epígrafe da Educação, porque é onde a questão tem estado mais visível - aplica-se, no entanto, a toda a actividade do Estado, em todas as suas manifestações.



Maria Manuel Leitão Marques, Secretária de Estado da Modernização Administrativa, fala no Diario Economico.com, da Avaliação. Não tenho qualquer qualificação a fazer - o texto é impecável.



"Com poucas excepções, Portugal e outros países filiados na mesma tradição administrativa têm pouco hábito de convívio com uma cultura de avaliação. Avaliação das leis, das políticas e das reformas. Avaliação das instituições públicas. Avaliação dos seus dirigentes e dos funcionários.Nas leis e nas reformas, isso pode conduzir a que se sucedam umas às outras, cometendo os mesmos erros, por não terem sido identificados os anteriores. Faz ainda com que raramente se saiba se os resultados alcançados foram os inicialmente pretendidos.Nas instituições, a falta de avaliação leva a que não se detectem e corrijam más orientações de gestão e que não seja possível premiar as mais bem sucedidas.A ausência de avaliação das pessoas faz com que a sua progressão nas carreiras se faça pelo decurso do tempo. Induz a uma acomodação a práticas pouco eficientes e retira o incentivo a um melhor resultado profissional. Obviamente, também não permite distinguir os bons profissionais, que sempre existirão apesar disso..



Porque tal aconteceu ao longo de muitos anos, é natural que qualquer tentativa de introduzir uma cultura de avaliação suscite resistências, não encontre adeptos e tenha até dificuldade em instalar-se por falta de competências necessárias para que a avaliação possa ser feita com o rigor desejado.Quando a cultura de avaliação chegou às Universidades, na década de 90, também não foi recebida com aplausos, pese embora a carreira académica dos docentes ter sempre dependido de uma avaliação feita por pares. A resistência fez-se especialmente notar quanto à realização de inquéritos aos alunos sobre a prestação dos respectivos professores. Mas progressivamente as práticas de avaliação foram sendo absorvidas e comprovou-se até que os alunos raramente penalizam os professores mais exigentes, bem melhor cotados do que os mais faltosos. O mesmo aconteceu aos centros de investigação, neste caso avaliados por maioria de investigadores estrangeiros, exigindo dos Centros um elevado esforço de organização e passando os resultados a condicionar o financiamento para os anos seguintes.



Alguns dirão que ainda hoje qualquer destes sistemas está longe de ser perfeito. Com certeza. Mas será que existe um sistema perfeito de avaliação, totalmente objectivo, por exemplo?É de esperar que as dificuldades sejam mais visíveis e as resistências mais sonoras quando se trata de instituir sistemas de avaliação de pessoas, do que quando se trata de avaliar instituições. Mas a raiz dessa dificuldade é idêntica nos dois casos: um país com poucos hábitos de competição, que viveu muitos anos orgulhosamente só e pensou que poderia sobreviver eternamente assim. Convivendo com desperdício, maus resultados, ineficiências. Esperando que a qualidade surgisse por acaso, de esforços individuais notáveis que sempre despontam aqui e acolá, sem necessidade de organizadamente fazer algo por ela.Uma parte importante do sector privado (empresários e trabalhadores), que também passou por essa fase, aprendeu à sua custa que o mundo tinha mudado. E que as suas organizações deviam mudar também. É por isso que alguns dos aspectos mais contestados na avaliação dos funcionários públicos são hoje rotinas com que se convive regularmente nas empresas.Mas a seu lado o sector público permaneceu quase incólume. Como se o que mudava no mundo não lhe dissesse respeito.



Porém, a competitividade e a própria sobrevivência dos países também depende actualmente da capacidade do respectivo sector público reduzir burocracia, aumentar a sua eficiência, ajudar a melhorar as qualificações. Isso faz com que ninguém possa eximir-se a esse esforço de maior exigência e rigor, seja qual for a sua posição no mercado de trabalho.Obviamente, a falta de cultura de avaliação não é a causa de todas as nossas desgraças, nem a sua introdução um remédio salvador. Não é mãe de todas reformas das nossas instituições públicas. É apenas um aspecto importante delas. Pode ser adiada? Pode, claro. Um, dois , três, vinte anos, a vida toda. Podemos adiar o país todo. Com o risco de quando dermos conta ele já não existir."

2 comentários:

maria disse...

Pois a senhora tem toda a razão.Tem que haver avaliação, não só das pessoas mas das medidas legislativas que vão sendo tomadas. O que tem acontecido na educação, por exemplo, é que a toda a hora vem uma nova disposição sem que a que vai ser substituída seja avaliada. Ou seja onde estava o mal da anterior, nós até podemos saber mas não é dito.

José Matias disse...

Estou absolutamente de acordo com isso (ver a nota de hoje). Como estou de acordo com a necessidade de passar as soluções por fases de experimentação e por aí adiante...