20 de outubro de 2008

Digressões...

Gostei de ler esta crónica: Nick Cohen: Let's talk about class rather than colour Comment is free The Observer .
Vejam, por exemplo, este excerto:

"Lowles has been studying the history of anti-fascism and thinks we are in a far worse position than in the Thirties or Seventies, when the left last battled the far right. Without wishing to romanticise the past, you can at least give the old left credit for having an ideology that encouraged immigrants and natives to see themselves as fellow members of the working class or - when feeling particularly high-minded - 'the brotherhood of man'. "
Na verdade, na Europa (mas não - até onde consigo ver - nos EUA) houve e há um "povo de esquerda". Ele criou-se nas lutas sociais do século XIX, na luta contra os atropelos (e conservadorismo) do capitalismo inicial, e, nomeadamente, na luta contra o fascismo no século XX. Continua a existir, de modo precário, vivendo ideologicamente do que resta desse património - vai restando cada vez menos porque, como devia ser sabido, quando não se investe no mínimo para repor o que se gastou pelo uso e pela obsolescência, perde-se aquilo que se herdou. Muito do que resta desse património são alguns bons sentimentos, alguma boa consciência, algumas regras empíricas de avaliação e de actuação, e pouco mais.

A esquerda europeia socialista, social-democrata, constatou a falência da alternativa comunista ("anti-fascista"), mas não foi capaz - nem considerou isso necessário - actualizar a sua alternativa ideológica face ao que tinha mudado e àquilo que prometia suceder. E aquilo que foi tentado - a "terceira via" do partido trabalhista - é denegrido de modo ignorante e chocarreiro. A esquerda europeia não-comunista não tem, por isso, uma "visão do mundo" coerente que imprima um sentido estratégico à sua actuação. Ela desistiu de transformar o mundo, e essa tarefa é mais do que nunca premente - ela não assume como suas e não responde de modo reflectido, articulado, coerente, às questões da regulação do sistema económico e financeiro; à necessidade de se ultrapassar o uso das energias fósseis; aos problemas colocados pelo aquecimento global e, assim, por diante.
A implicação é preocupante; as consequências serão diversas conforme os países e as regiões (veja-se o caso do RU retratado no artigo), mas em todos os casos a situação é definida pela impreparação e pelo desarme político, ideológico, estratégico, do "povo de esquerda". É a "pobreza da política".
A "pobreza da política" traduz-se, por um lado, no estreitar do horizonte que se pode perspectivar de problemas e de possibilidades; por outro, na redução da profundidade considerada desse horizonte. Naturalmente, isso acaba por explicar a predominância das ditas soluções tecnocráticas e de curto prazo: na ausência de uma política que se questione de modo estratégico, fundado e conhecedor sobre as alternativas técnicas de concretização daquilo que perspectiva, temos políticos que perguntam aos técnicos - no melhor cenário - o que se pode fazer, dentro deste prazo e no quadro deste orçamento - e estes fornecem o leque de alternativas que têm em cada momento e que aprenderam a utilizar; no pior cenário - nomeadamente quando a restrição orçamental é lassa - nem se pergunta, e mesmo o potencial daquilo que existe de factível e oportuno, do ponto de vista técnico, não é concretizado.
Enfim.

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