No seguimento da nota do Blasfémias referenciada aqui, tenho participado no debate (curioso) com uma série de apontamentos (e assim não vou escrevendo sobre os manifestos dos economistas - mas não passa deste fim de semana).
O último meu apontamento faz um citação extensa de Karl Popper - estou a entrar em "deep waters" - e, mais que não fosse por isso, para futura referência, reproduzo-o aqui:
"Karl Popper, Busca Inacabada - Autobiografia Intelectual, Esfera do Caos, pp. 147, 148:
""... quanto ao meu grau de corroboração, a ideia era resumir, numa curta fórmula, um relatório da maneira como uma teoria passou - ou não passou - nos seus testes, incluindo uma avaliação da severidade dos testes: só os testes empreendidos num espírito crítico - refutações tentadas - deveriam contar. Passando esses testes, a teoria poderia "provar que era capaz" - a sua "aptidão" para sobreviver aos testes a que tinha sobrevivido; tal como no caso de um organismo, a "aptidão", infelizmente, significa apenas sobrevivência presente, e o desempenho passado de modo algum assegura sucessos futuros.
Via (e ainda vejo) o grau de corroboração de uma teoria meramente como um relatório crítico sobre a qualidade do desempenho passado: não poderia ser usado para prever o desempenho futuro (a teoria, claro, pode ajudar-nos a prever acontecimentos futuros). Assim, tinha um índice temporal: só se pode falar do grau de corroboração de uma teoria num certo estádio da sua discussão crítica. Em alguns casos, proporcionava um guia muito bom se quiséssemos avaliar os méritos relativos de duas ou mais teorias em competição, à luz das discussões passadas. Quando postos perante a necessidade de agir, com base numa ou noutra teoria, a escolha racional era agir com base na teoria - se houver alguma - que até ao momento tinha resistido à critica melhor do que as suas competidoras: não há melhor idéia de racionalidade do que a prontidão para aceitar a crítica; ou seja, a crítica que discute os méritos de teorias em competição do ponto de vista da idéia reguladora de verdade. De acordo com isto, o grau de corroboração de uma teoria é um guia racional para a prática. Embora não possamos justificar uma teoria - ou seja, justificar a nossa crença de que é verdadeira - podemos por vezes justificar a nossa preferência por uma teoria em relação a outra; por exemplo, se o seu grau de corroboração for maior""
Como interpreto aquilo que Popper diz acima - e aplicando-o ao caso em questão - a teoria da responsabilidade humana no aquecimento global e a teoria do aquecimento global, têm vindo a ser corroboradas pelos dados do paleoclima, do comportamento do clima no século XX, pela evidência de outras ciências (por exemplo, o efeito dos gases de estufa; evolução do crescimento sustentado do CO2, mas não só dele), pela explicação das situações anómalas que tem vindo a ocorrer (comportamento do gelo nos polos e nos glaciares; comportamento das plantas e dos animais) e, finalmente, pela capacidade dos modelos climáticos em reproduzir a história climática verificada até agora.
No entretanto, fazem-se predições (susceptíveis de serem falsificáveis) na base dessas teorias, não só quanto a um futuro medido em décadas, mas também quanto aos próximos anos.
Em todo o caso, a corroboração dessas teorias, face às alternativas que as negam, fazem delas guias racionais para a prática [para usar a expressão usada por Karl Popper] - o perigo de não fazer nada, ocorrendo aquilo que prevêem, é altíssimo, donde por motivo precaução é imperioso que se procure a contenção [do aquecimento global] (ou, de outra forma, temos de estar segurados para a eventualidade de ocorrer o pior). Mas aquilo que é necessário fazer, seria necessário fazê-lo em qualquer caso (mesmo que aquelas teorias não fossem corroboradas): o uso mais eficiente da energia e de todos os inputs produtivos (nos transportes, construção civil, actividade económica) [é justificado] devido à possibilidade da ocorrência do esgotamento dos carburantes fósseis a curto prazo; do aumento da degradação ambiental e pela necessidade de alimentar toda a população mundial. Quem ganha com isso não começar a ser feito de imediato?"
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