8 de junho de 2008

Preços em Portugal e no resto do Mundo

Teodora Cardoso em Preços - DiarioEconomico.com fala da conjuntura dos preços e das lições que devem ser retiradas do que se passa - é do melhor do que tenho lido sobre o que se passa neste momento. O comportamento dos preços em Portugal é curioso. A transcrição do artigo:
  • "Em Abril, Portugal detinha a mais baixa taxa de inflação da Zona do Euro a seguir à Holanda. Nos últimos doze meses os preços subiram 2,5% em Portugal. Na presente década, só em 2005 se registou uma inflação média inferior: 2,1%. Analisando a evolução por tipos de bens, verificamos que o preço dos produtos alimentares não transformados caiu 1% ao longo dos últimos 12 meses. Devido sobretudo à subida do custo da energia, o preço dos alimentos transformados cresceu 8,4%, levando a um acréscimo do preço da alimentação de 3,5%. Por seu lado, o preço dos produtos energéticos subiu 8,8% em Portugal, contra, por exemplo, 13,3% em Espanha. Quer em termos de comparações internacionais, quer por confronto com a história das subidas de preços – e das quedas de salários reais – em Portugal em tempo de crises anteriores à integração na moeda única, estes valores, embora preocupantes, estão longe de ser dramáticos.
    A subida dos preços internacionais nestas categorias de produtos é evidentemente uma questão muito séria, mas é sobretudo uma lição e uma oportunidade. A lição resulta da constatação de que, ao longo das últimas décadas, o mundo – e em especial os países desenvolvidos – ignoraram os problemas que se iam acumulando nesses dois sectores-chave. Por um lado, incentivou-se o desperdício, por outro abandonou-se o investimento.
    No contexto do sistema capitalista e da racionalidade que esperamos das decisões do mercado, é esta última omissão que é indesculpável. Não nos precipitemos, porém, a argumentar que a culpa foi principalmente do mercado. Na verdade, estamos, tanto no caso dos produtos agrícolas como do petróleo, perante mercados internacionais muito imperfeitos. As enormes flutuações de cotações, as intervenções destinadas a garantir preços baixos e “segurança da oferta” redundaram em prejuízo dos investimentos necessários. No sector da energia, estes exigiam enormes capitais, tecnologia, tempos de maturação e preços estáveis que os justificassem. Na agricultura supunham – por exemplo, na maior parte dos países africanos – contextos político-administrativos favoráveis à produção local, de preferência à importação proveniente dos países desenvolvidos, financiada por subsídios ou facilitada por taxas de câmbio sobreavaliadas. A inexistência destes pressupostos gerou uma situação em que a maior parte dos terrenos agrícolas africanos não são cultivados e em que o baixo custo do petróleo não permitiu, nem o desenvolvimento de energias alternativas, nem sequer o investimento necessário na própria exploração petrolífera, a ponto de esta se defrontar agora com a escassez de pessoal técnico – que não se formou ao longo dos últimos anos – e dos equipamentos complexos indispensáveis.
    Tudo isto em paralelo com o aumento da população mundial e com o crescimento das grandes economias asiáticas que iam inevitavelmente pressionando a procura desses produtos.
    Porém, a miopia instalada, tanto na política como nos mercados financeiros, fez com que o investimento se dirigisse para o consumo dos países ricos, financiado por dívida, em grande parte financiada pelos países emergentes, iludindo durante alguns anos os problemas ... até ao eclodir da crise.A saída inteligente para os erros cometidos consiste em compreendê-los e corrigi-los. Graças à crise, os mercados apontam as soluções: o investimento e os ganhos de eficiência na energia e na alimentação, a par com a correcção dos desperdícios e dos excessos de endividamento dos consumidores nos países desenvolvidos.
    A análise das políticas que estiveram na origem dos problemas mostra também o que não pode fazer-se. Conceder subsídios indiscriminados para abater os clamores, continuar a privilegiar o transporte individual relativamente ao colectivo e a abandonar as infraestruturas urbanas, ou intervir nos mercados agrícolas, partindo da ideia de que os consumidores dos países pobres são pouco mais que um escape (coberto pela boa consciência da “ajuda”) para os excessos de produção dos ricos, fazem parte dos principais erros a evitar.
    Estamos a viver uma conjuntura internacional em que finalmente começa a expandir-se uma classe média nos países emergentes. Esse é um benefício para todo o mundo, mas exige a reatribuição dos recursos do planeta e o desenvolvimento de tecnologias e de atitudes apropriadas. Não é, porém, compatível com a reivindicação de soluções de curto prazo que só agravariam os problemas. É a miopia anterior que estamos a pagar. Convém, por isso, ajustarmos as lentes com que olhamos para o mundo."
Não poderia estar mais de acordo!

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