11 de janeiro de 2009

Economia em tempos difíceis - discussão na Universidade dos Açores

A sessão promovida pela Ordem dos Economistas - à qual tenho de aderir um destes dias - promoveu uma sessão para discussão da conjuntura económica, contando com a presença dos Professores Campos e Cunha e Gualter Couto, e Dr. Gualter Furtado. Muito interessante, com a mensagem a ser (muito) preocupante, no que se refere à sustentabilidade das finanças públicas e a vulnerabilidade criada com o aumento progressivo do peso da dívida externa portuguesa.














Por uma questão de memória, alguns apontamentos do que foi dito:














  • Campos e Cunha factualizou a crise e referiu o perigo da sua "Japonização" - subalternização da solução da crise bancária; o recurso a sucessivos de pacotes de estímulos orçamentais sem efeitos de resolução sustentados na crise económica e na deflação (no entanto, Krugman defende que o problema foi uma resposta orçamental não atempada e sem a dimensão adequada ao problema: ver, por exemplo: Deficits and the Future; Media cite Japan's "lost decade" to criticize Obama's economic stimulus plan, but economists disagree).





    Apontou a situação orçamental portuguesa - mesmo antes dos pacotes - como tendo piorado em 2008 (neste blogue convirá reler, ou ler, esta nota, para recordar o que o Professor pensa sobre a resolução dos problemas orçamentais portugueses).





    Chamou a atenção para a divergência crescente entre os valores do PIB e do RN nacionais, resultante dos pagamentos líquidos ao exterior com origem no pagamento dos encargos de uma dívida externa em crescimento acelerado (no caso da Irlanda, a origem está no repatriamento dos lucros gerados pelo forte investimento externo verificado naquela economia ao longo das últimas décadas) e para a vulnerabilidade induzida por esse comportamento da dívida externa portuguesa - crescimento do spread da dívida; possibilidade de contágio de eventuais crises de crédito de países em piores situações do que a nossa (caso da Grécia).





    À luz disso (sustentabilidade das finanças públicas, gestão da evolução da dívida externa) e da necessidade de dar resposta à crise, articulou as suas recomendações:





    Reduções de impostos, a acontecerem, só de forma limitada e cirurgica (estava a falar do país, mas, de novo, aproveito para relembrar que no caso dos Açores as razões para não haver desagravamento fiscal são ainda mais ponderosas);





    Privilegiar, em termos de despesa e investimento público, as pequenas obras, disseminadas por todo o país - controlo dos primeiros efeitos do multiplicador; (não me recordo se referiu a rapidez desses efeitos: - neste momento, nos EUA, discute-se se essa rapidez é determinante em todo o caso:Is the Implementation Lag for Infrastructure Investment a Problem?).
    A sua posição em relação aos grandes investimentos públicos ( Campos e Cunha it´s not dead) reiterou-a: ou são capazes de gerarem um fluxo positivo de rendimento (líquido do pagamento do seu investimento e dos custos do seu funcionamento) ou não devem ser concretizados (daí a necessidade dos famigerados estudos custo-benefício, que afirmou não existirem). Oposição feroz aos TGV, às auto-estradas - aceitação (relutante) do investimento nas barragens: referiu que investimento na via férrea de alta-velocidade asseguraria o aproveitamento dos fundos comunitários (a contrário do que foi mencionado aqui), e que, em qualquer caso, esses só cobririam 30% do investimento, ficando sempre de pé a necessidade de se verificar aquele fluxo líquido de rendimento (em que não acredita).



    Em suma, tudo - além da esfera privada da economia, a gestão orçamental, o investimento público, a resposta à crise, - desemboca, directa ou indirectamente, na conformação da evolução da dívida externa (a economia portuguesa não consegue gerar um nível suficiente de poupança que cubra as necessidades de financiamento da despesa agregada, pública e privada, portuguesa). Isso não significa que não se tenha de acudir ao que é mais premente - a resposta à crise assente na política orçamental -, mas que, aquilo que tenha de ser feito, o seja da forma mais eficiente possível - obter o máximo de resultados (eficácia) para um dado nível de recursos.









  • As outras duas intervenções centraram-se nos Açores (ambas úteis e interessantes): Gualter Furtado descreveu a situação do sector bancário dos Açores como sendo de inspirar confiança; não percebi o que quis dizer sobre o despesismo que vai por este mundo fora, no contexto actual: (crítica à dimensão dos pacotes orçamentais de estímulo?); e gostaria que tivesse concretizado o que queria insinuar quanto ao haver regiões em muita pior situação do que os Açores (embora, desconfie de quem estava a falar - não tenho é os "hard facts").


    Aquilo que Gualter Couto fez foi desmontar a eficácia, e nalguns casos, a correcção ("moral hazard") das medidas anunciadas pelo Governo à crise (à "soi-disant" turbulência). Afigura-se-me correctas as suas observações, e em relação a uma delas (a intervenção do governo regional no mercado imobiliário), eu próprio já a assumira como (totalmente) incompreensível (para pôr as coisas de modo suave), e isso também sustentado no que é dito neste artigo da Telos (terceiro parágrafo): Le mirage de la relance ciblée (devem ler o artigo todo):

    "L’argent va aux promoteurs immobiliers. Avant que les concurrents n’aient compris ce qui allait arriver, ils ont obtenu que l’Etat rachète les logements récemment construits mais pas encore vendus, et donc invendables pour l’instant... [ler o resto no link indicado imediatamente acima]"
    Não creio que a regulamentação, pelo menos desta medida, remende o pecado original da sua concepção.

PS (12.01.09): Esqueci-me de mencionar a posição de Campos e Cunha sobre as PPP (Parcerias Públicas Privadas): é (minha interpretação) de desconfiança - penso que referiu serem mais uma modalidade de bolha especulativa -, com resultados não seguros, não sendo certo o resultado final para as finanças públicas. A Alemanha não recorreu às PPP.

PS (II): A-propósito da Japonização, estímulos orçamentais, recuperação bancária, ler esta opinião de Krugman, What to Do, na The New York Review of Books. Alguns excertos:

  • "Now, the United States tried a fiscal stimulus in early 2008; .... The actual results were, however, disappointing, for two reasons. First, the stimulus was too small, accounting for only about 1 percent of GDP. .... Second, most of the money in the first package took the form of tax rebates, many of which were saved rather than spent. The next plan should focus on sustaining and expanding government spending—sustaining it by providing aid to state and local governments, expanding it with spending on roads, bridges, and other forms of infrastructure."
    "The usual objection to public spending as a form of economic stimulus is that it takes too long to get going—that by the time the boost to demand arrives, the slump is over. That doesn't seem to be a major worry now, however: it's very hard to see any quick economic recovery, unless some unexpected new bubble arises to replace the housing bubble."
    "... As long as public spending is pushed along with reasonable speed, it should arrive in plenty of time to help—and it has two great advantages over tax breaks. On one side, the money would actually be spent; on the other, something of value (e.g., bridges that don't fall down) would be created. Some readers may object that providing a fiscal stimulus through public works spending is what Japan did in the 1990s—and it is. Even in Japan, however, public spending probably prevented a weak economy from plunging into an actual depression. There are, moreover, reasons to believe that stimulus through public spending would work better in the United States, if done promptly, than it did in Japan. For one thing, we aren't yet stuck in the trap of deflationary expectations that Japan fell into after years of insufficiently forceful policies. And Japan waited far too long to recapitalize its banking system, a mistake we hopefully won't repeat."
























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