NOTAS SOBRE
A ARTICULAÇÃO ENTRE ENSINO, DESENVOLVIMENTO E POLÍTICA NOS AÇORES
1) Articulação "
Ensino - Desenvolvimento" nos Açores
É
consensual o afirmar-se o carácter estratégico determinante da educação
no desenvolvimento. Tão consensual que a afirmação se trivializa,
desculpando o não aprofundamento da análise de tudo aquilo que torna
a afirmação verdadeira e empobrecendo a tarefa da descoberta das saídas
que permitiriam uma mais eficiente operacionalização daquele papel
da educação na luta pelo desenvolvimento. No caso dos Açores, a trivialização
daquela afirmação implica que se esbata - ao nível da análise, do
discurso e da prática - a especificidade local da articulação
educação « desenvolvimento,
especificidade que torna relativamente mais importante e imperiosa a
obtenção de desempenhos superiores do sistema educativo açoriano.
A problemática económica nos Açores e as perspectivas da sua evolução
futura, fazem com que aqui o ensino revista uma importância estratégica
ainda mais decisiva e importante do que pode assumir e assume
no resto do país. Porquê ?
Um
crescimento económico sustentado nos Açores é condição
sine qua non da viabilidade duma sociedade açoriana que perpetue
no século XXI uma história e uma cultura velhas de cinco séculos.
Na verdade - e admitindo o melhor cenário quanto à não verificação
de alterações bruscas e profundas nas condições ambientais e nos
parâmetros políticos internacionais, (esses outros cenários só viriam
a acentuar a urgência em equacionar de forma eficaz aquela articulação)
- um crescimento económico sustentado e endógeno apropriado, é condição
necessária para a fixação das populações, ao possibilitar níveis
de vidas que suportem a comparação com os níveis alcançados no continente
português e no resto da Europa. Assim não sendo, criar-se-ão, no
mínimo, só por isso, incentivos muitos fortes à deslocalização
das populações açorianas, acentuando fenómenos demográficos já
em curso. Contar indefinidamente com a solidariedade nacional e europeia
para suplementar uma performance menos adequada da economia açoriana,
colmatando o fosso entre taxas de crescimento do rendimento, previsivelmente
(se se não inverter algumas tendências), progressivamente divergentes,
é atitude acomodada e perigosa. Essa solidariedade, convenhamos, terá
sempre de estar presente, mas a economia açoriana tem de crescer
o suficiente para manter pelo menos constante, em termos relativos,
a necessidade do apoio exterior ao rendimento açoriano, no médio e
longo prazo.
E
como se pode verificar esse crescimento económico sustentado e endógeno
nos Açores que assegure aquele resultado ? Basicamente, pelo influenciar
dos factores que possibilitem ganhos de produtividade globais na actividade
produtiva açoriana, em todas as suas variantes. Não se podem esperar
contributos significativos para o crescimento económico açoriano com
origem na evolução demográfica. No que respeita ao investimento,
pela fraqueza do seu efeito despesa - do seu efeito multiplicador no
rendimento - e pela reduzida probabilidade de ver aumentado o seu peso
relativo na despesa (quer pelo nível consideravelmente elevado já
alcançado quer porque por esse aumento dependeria necessariamente do
exterior) não se pode esperar que ele, por si só, assegure as taxas
de crescimento que se impõem. O crescimento económico dos Açores
terá de ser essencialmente do tipo intensivo, logo assente no
aprofundamento da eficácia e eficiência na utilização dos recursos
humanos e de capital que a região pode mobilizar. O aprofundamento
da eficácia e eficiência na utilização dos recursos produtivos
apela para o inculcar de valores, da implementação de práticas e
a aquisição de saberes que possibilitem o alcançar e a aceitação
por parte da população açoriana
de níveis superiores de exigência, de profissionalismo, de mobilidade
e de desafio. E isso além do mais, porque o crescimento económico
nos Açores, devendo ser intensivo, terá de incorporar componentes
fortes de experimentação, de abertura ao exterior (às
influências económicas, culturais, tecnológicas), de diversificação,
de upgrading das actividades produtivas já instaladas.
O padrão de crescimento que se verificou na primeira fase da autonomia
caracterizou-se por assentar quase exclusivamente no aumento da despesa
e investimento público, viabilizados pela drenagem de recursos avultados
do exterior, não sendo acompanhado, nomeadamente, pelo reconhecimento,
por parte do poder político, da necessidade de acordar e de dinamizar
a sociedade para um papel mais activo e autónomo nas tarefas, em todas
as tarefas, do desenvolvimento. Não reconhecimento, falta de vontade
ou incapacidade política em fazê-lo: o certo é que tudo isso, nitidamente,
teve por contraponto a convicção de que era possível ascender a níveis
progressivamente superiores de rendimento sem grandes alterações,
sem grandes exigências, sem grandes reequacionamentos. O pecado
mortal da velha autonomia foi a complacência1. O modelo seguido até aqui está
esgotado!
Ao
sistema de ensino caberá grande parte da tarefa da criação dos factores
que possibilitem os ganhos de produtividade acima referidos.
Essa tarefa é à partida extremamente dificultada pela percepção
extremamente pobre e redutora que a esmagadora parte da população
açoriana tem do ensino e do saber, o que se traduz quer numa procura
pouco exigente do serviço prestado pelo sistema de ensino quer na hostilidade
ao aumento da qualidade da oferta desse serviço, se esse aumento de
qualidade passar, como deve passar em grande parte, por um acréscimo
de exigência. Essa tarefa é dificultada pelo nível insuficiente de
recursos que são canalizados para o sistema de ensino. Essa tarefa
foi, e está a ser, dificultada pela incapacidade do partido,
até ao momento no poder nos Açores, de pensar estrategicamente os
Açores, de pensar estrategicamente o desenvolvimento nos Açores e,
logo, de pensar estrategicamente o ensino nos Açores, remetendo-se
para uma gestão imediatista, burocrática, nada imaginativa, nada criativa,
do sistema de ensino, e restringida ao mero dispêndio das verbas orçamentadas.
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[1]A guerra fria iria continuar ad
aeternum; não necessitávamos de promover o turismo; não necessitávamos de
nos preocupar com as questões ecológicas; os fundos da União nunca deixarão de
vir (nunca?); tudo viria por acréscimo, sem grandes exigências e sem grandes
ambições, etc.; no fundo, a internalização cultural da ultraperificidade.
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