7 de abril de 2008

Política económica - outra perspectiva

Tenha-se em atenção o que se diz na última nota. Nesta, fazemos referência a um artigo de Pedro Adão e Silva, no DiarioEconomico.com, Que fazer com a consolidação?, que visita também o momento por que passa a política orçamental portuguesa - o que diz, é muito mais favorável à actuação do Governo, e tem razão quando identifica as dificuldades e o que foi feito. Naturalmente, as minhas dúvidas sobre a sustentabilidade dos resultados obtidos com a consolidação orçamental, mantêm-se - por exemplo, não sei, note-se, qual é quota parte da responsabilidade dos congelamentos salariais e das progressões nas carreiras na contenção do crescimento da despesa pública (os dados apresentados neste artigo, indiciam que foi muito importante); este é o tipo de despensa cuja contenção é susceptível de ser facilmente anulada.




De acordo com a necessidade da diferenciação estratégica entre os partidos, mas essa diferenciação poderia e deveria ter, no processo de consolidação orçamental, um dos seus momentos decisivos - um mesmo objectivo pode ser alcançado por caminhos diferentes: não há falta de soluções técnicas; o que falta é a multiplicidade alternativa de objectivos e metas políticas; o predomínio do político não é assegurado na ausência da técnica, mas sim na sua capacidade (o que implica, no mínimo, alguma literacia nesses domínios, por parte dos políticos) de aceitar ou regeitar soluções técnicas.





O artigo:




"Depois de oito anos em que a consolidação das contas públicas foi o alfa e o ómega da vida política portuguesa, a semana passada, enquanto se baixava o IVA, foram decretadas as condições para finalmente discutir a vida para além do défice. As declarações do primeiro-ministro anunciando o fim da crise orçamental são disso sinal claro. É certo que todos os cuidados devem ser poucos, tendo em conta, desde logo, o arrefecimento económico internacional, que torna as previsões para o crescimento económico português optimistas.




Ainda assim, do ponto de vista orçamental, o que este governo alcançou é, simultaneamente, notável e instrumental. Notável porque a redução do défice para 2,6% do PIB já em 2007, quatro décimas abaixo do previsto no programa de estabilidade e crescimento para o ano de 2008 e, note-se bem, 3.5 pontos abaixo dos aterradores 6,1% com que encerrámos o ano de 2005, é, por si só, muito positiva e o valor mais baixo em democracia. Que este objectivo tenha sido alcançado sem recurso a receitas extraordinárias ou às manigâncias orçamentais do passado, mas baseado numa combinação – que foi exigente para os portugueses, é verdade – entre maior esforço e eficácia fiscal e contenção da despesa cria condições para encararmos o futuro com mais optimismo. Afinal, convém não esquecer que cerca de 75% da redução do défice se ficou a dever à redução da despesa pública, o que aliás serve para contrariar o mito de que tudo se deve a um aumento da receita. Se nos restringirmos à redução da despesa com pessoal da administração pública em % do PIB, Portugal evoluiu de 14,5% em 2005 para 12,8% em 2007, uma trajectória que não encontra paralelo na zona Euro desde que há registos.




Instrumental porque, para além do mais, no que é a marca distintiva do governo de José Sócrates por comparação com o de Durão/Portas, o actual executivo soube combinar esforço de consolidação orçamental com capacidade de reformar outras áreas das políticas públicas, introduzindo ao mesmo tempo “almofadas sociais” (por ex. os aumentos no salário mínimo), e utilizou ainda esta necessidade para levar a cabo reformas que de outro modo seriam provavelmente impraticáveis. A este propósito, alguém duvida que teria sido bem mais difícil equiparar a idade de reforma para os funcionários públicos à do regime geral da segurança social, introduzir o factor de sustentabilidade nas pensões, encerrar falsas urgências ou escolas com poucos alunos sem a existência de um constrangimento financeiro? Ou seja, por paradoxal que possa parecer, o desequilíbrio orçamental até pode ter sido virtuoso na facilitação de reformas que significam mais equidade.





Mas isto não deve servir para nos afastar do essencial: a indisciplina orçamental tem sido o mais poderoso inibidor do pensamento estratégico para Portugal, designadamente porque levou a que a política se tivesse viciado numa discussão sobre quem é melhor a gerir as contas públicas. Repare-se bem, gerir: o que, no essencial, pressupõe opções técnicas quase totalmente desprovidas de dimensão estratégica. E é na estratégia que os partidos se devem diferenciar.Tal não significa desvalorizar a importância da consolidação orçamental. Pelo contrário, esta é uma condição necessária para se poder (re)introduzir a diferenciação ideológica e a distinção entre partidos e espaços políticos. Num país ideal, todos os partidos encontrar-se-iam na importância de contas públicas equilibradas, para logo a seguir se diferenciarem no que fazer com o equilíbrio orçamental. É por isso que, resolvida a questão orçamental, o debate agora deveria passar a ser mais sobre as visões diferentes para o país e as grandes opções estratégicas. Depois do país politico ter ficado viciado na discussão sobre o défice, resta saber quanto tempo demorará a libertar-se dos termos desse debate. Agora, não só existem as condições para que tal seja feito, como há mesmo a obrigação. Se nada mais, para que os portugueses percebam exactamente o que é que estão a escolher quando votarem nas próximas legislativas. E as diferenças, mesmo que até agora relativamente secundarizadas, continuam a ser muitas."

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