9 de maio de 2008

Viver sem o euro

Um editorial do DiarioEconomico.com, de Bruno Proença, Viver sem o euro, a que não oponho qualquer comentário. Abaixo junto outras referências ao assunto. O artigo:









  • ... já não sabe viver sem o euro. Se tiver à sua disposição uma cápsula do tempo, não vai querer regressar aos anos 80: os tempos em que o escudo era rei. Os juros e a inflação estavam nos dois dígitos. E recorrer ao crédito bancário era um luxo apenas à disposição da aristocracia nacional. Além disso, o escudo era usado da pior maneira enquanto parte fundamental de política câmbial. As famosas desvalorizações que serviam para disfarçar a falta de competitividade das empresas nacionais e roubar poder de compra às pessoas.


    Quem na década de 90 liderou as campanhas de recolha de assinaturas contra a adesão ao euro, deve hoje corar de vergonha. O tempo provou, sem margem para dúvidas, que estavam enganados. O euro é um sucesso. Teve os seus momentos maus no início da década mas a sua cotação actual contra o dólar é a prova que é uma moeda credível em termos internacionais. Ainda está longe o dia em que o euro vai suplantar o dólar como a moeda mais importante mas só o facto dessa hipótese estar em cima da mesa é mais um sintoma do sucesso. Isto é também o resultado do êxito do projecto europeu em termos políticos e económicos.


    Apesar de todos os seus problemas, a União Europeia é hoje um espaço de paz, estabilidade social e desenvolvimento económico. É bom viver na Europa e beneficiar da sua qualidade de vida. Portugal também beneficiou disso desde que entrou para o projecto de integração europeia e fez um esforço considerável para ser fundador do euro. Apesar de continuar a ser um dos países mais pobres da Europa, a verdade é que houve um salto inegável em termos de desenvolvimento.


    Com a adesão ao euro, os portugueses passaram a beneficiar de juros mais baixos e de maior estabilidade na condução da política económica. Isto facilitou e generalizou o recurso ao crédito. Comprar casa, carro, ir de férias passou a estar ao alcance da maioria da população. Os altos níveis de endividamento mostram que existiram abusos. Ainda assim, subiu-se um degrau que já ninguém está disposto a descer. Portugal entrou numa nova etapa da sua maturidade económica.


    Posto isto, é preciso recordar a máxima dos mercados: ganhos passados não são garantia de ganhos futuros. Os primeiros dez anos de euro merecem ser celebrados mas e agora? É preciso mais. A Europa tem de prosseguir o seu projecto de integração económica ou vai acabar por partir. Já tem uma política monetária comum, falta agora um verdadeiro governo económico que garanta a implementação das políticas correctas para promover o crescimento e o emprego. O Pacto de Estabilidade e Crescimento é ainda uma experiência muito frágil, embora tenha o mérito de mostrar a dificuldade do caminho. Mas terá de ser feito. A actual situação é insustentável. Não se pode ficar a meio da ponte. Ou se volta para trás ou se passa para a outra margem. Portugal só pode defender um caminho: ir para a outra margem e a correr.






Wolfgang Munchau, editor associadp do Financial Times, também faz no Diário Económico o seu exercíco contrafactual sobre o que seria a Europa, na actual conjuntura económica, sem o Euro (ver aqui - já o tinha referido aqui com outro artigo - menos optimista - do The Economist sobre o mesmo assunto):









  • Para o leitor ter uma ideia do que mudou nos últimos 10 anos, imagine como seria o mundo sem o euro. Os mercados financeiros europeus teriam permanecido fragmentados; Itália há muito que teria desvalorizado a lira; Espanha teria anunciado que era preciso desvalorizar a peseta após as eleições legislativas para fazer frente à galopante crise imobiliária; Portugal e Grécia já iriam na terceira ou quarta desvalorização; e o presidente francês, Nicolas Sarkozy, ter-se-ia sentido tentado a desvalorizar o franco face ao marco alemão pouco depois da sua eleição para o Eliseu.


    Hoje em dia, as economias alemã, austríaca e do Benelux estariam paralisadas pelos “super poderosos” marco, florim e xelim, que teriam valorizado face ao dólar, ao franco, à peseta e à lira. Além disso, a desaceleração nos EUA teria devastado a economia europeia – tal como já aconteceu no passado. O leitor recorda-se, certamente, de outra velha e gasta metáfora: quando os EUA espirravam, a Europa constipava-se. Quem sabe agora vivemos num mundo em que são os EUA que se constipam e os europeus que espirram.


    Isto não significa que tudo está bem na zona euro. Pelo contrário, os leitores assíduos das minhas crónicas conhecem bem o meu obsessivo pessimismo relativamente à economia alemã e ao facto de esta ser incapaz de imprimir dinamismo aos sectores financeiro e dos serviços. Mas não há dúvida de que o desempenho da economia alemã é hoje mais robusto do que era no passado. Isto não releva de uma reforma económica e sim de uma mudança no regime macroeconómico. O euro criou um mercado interno vasto e estável, cuja dimensão é quase idêntica ao mercado norte-americano, embora seja mais aberto e mais dependente de influências externas do que os EUA.


    No entanto, as economias da zona euro são hoje mais robustas do que há 10 ou 15 anos. Pode acontecer que uma recessão nos EUA e que um dólar persistentemente fraco venham a afectar a zona euro. Existem diferentes canais através dos quais as fragilidades económicas dos EUA podem ser transmitidas ao resto do mundo, que incluem, entre outros, os lucros bancários, os mercados de acções e a queda nas exportações. Mas estes canais levam tempo a actuar no sistema. E embora me sinta tentado a concordar com as previsões do FMI para a zona euro em 2009, que situam a taxa de crescimento em 1,2%, não posso fazê-lo porque, para o crescimento baixar para 1,4% este ano seria preciso que acontecesse algo de verdadeiramente dramático. Ora, não há nada nas previsões do FMI que consubstancie essa possibilidade.



Do mesmo analista, e no mesmo jornal, poderão ler aqui outra crónica sobre o Euro, agora sobre a sua evolução (relativa ao dólar) enquanto reserva monetária internacional (ver também aqui).

Sem comentários: