O PSD, em declarações de Jorge Macedo de 25 de Outubro, afirmou que "Carlos César e o PS estão em fim de ciclo" e que, atendendo aos resultados obtidos por estes, se provava o cansaço dos açorianos "com o actual estado de coisas". Se o facto de Carlos César ir ter o seu último mandato como PGRA é um fim de ciclo, não discuto, é uma constatação trivial - ainda que, não conviesse (em termos de análise) descontar a influência que ele possa ter na política açoriana, ainda que de modo mediatizado, após 2012. A afirmação quanto ao fim de ciclo do PS já merece discussão, no mínimo em relação às próximas legislativas, em 2012.
É sabedoria convencional - nalguns meios regionais, pelo menos - que Berta Cabral se perfilará como candidatura temível para o PS, em 2012, mais que não fosse porque Carlos César não irá ser candidato. Nunca aceitei isso - sempre considerei que o PS tinha todas as possibilidades de ganhar de novo, nas próximas legislativas, independentemente das qualidades e dos méritos da Presidente da Câmara de Ponta Delgada, verificando-se algumas condições não díficeis de ocorrer. Essa é uma discussão com algum interesse, mas não é ela que me leva a escrever esta nota - o que está em causa, para já, é se os resultados eleitorais sustentam a tese de fim de ciclo do PS. Não sustentam - o erro metodológico é efectuar a análise dos resultados tendo só como comparação 2004: isso, aliás, acaba, de modo irónico, por esterilizar a importância da lição dos resultados de 2004 para a dinâmica eleitoral dos Açores, e logo, para os possíveis resultados em 2012.
- Os resultados a que se chegou assentaram na análise do comportamento eleitoral dos açorianos durante todo o período da governação socialista 1996-2008, com uma atenção particular ao que sucedeu em 2004 (pode-se aceder à folha de cálculo aqui).
Centre-se a atenção no PS; à sua direita, no PSD e no CDS; à sua esquerda, no PCP e no BE - os partidos mais pequenos (PDA, PPM, MPT) no período tem uma evolução positiva mas com valores absolutos muito baixos.
Quer o PS quer os partidos à sua direita, entre 1996 e 2008, perdem votantes - a intensidade da perda, no entanto, é superior no caso do PSD (significativamente) e no CDS (menos, e só em relação a 2000). Agregando os valores da direita essa percepção reforça-se.
Os valores da evolução média quadriénio no período 1996/2008 são os seguintes: PS, -4,6%; PSD, -16,23%; CDS, -2,01% (-9,58% para 2000/2008); PSD+CDS, -13,75 (-8,77% para 2000/2008).
A primeira conclusão é imediata: a direita açoriana não está bem em termos eleitorais . É impressionante a erosão eleitoral do PSD ao longo do período (perde 19.140 votos- desce sempre, mesmo em coligação com o CDS). Se o PS desce também, a intensidade da sua descida é bem menor da dos outros, à sua direita. A própria subida dos deputados do CDS em 2008 acontece perante a perda de 1.752 votos entre 2000 e 2008. A manter-se esta tendência o PS não teria nada a recear à sua direita (e que sucedeu em 2004 prova-o), e isso é verdade mesmo face ao reaparecimento de uma coligação PSD/CDS. - À esquerda do PS, o PCP afunda-se entre 1996 e 2008: perde 1.109 votos, e tem uma evolução média quadriénio no período de -10,43% (acentuada para o período 2000/2008: -23,64%, já que subira entre 2000 e 1996).
O BE, é com o PS (já explico melhor, no ponto 3, em relação a este) a grande história de sucesso eleitoral nos Açores, no período da governação socialista: mais que triplica a sua votação, ganhando 1.193 votos (tomei a UDP como proxy do BE em 1996).
No entanto, agregando as votações à esquerda do PS (PCP+BE) o resultado não é de molde a preocupar o PS, quer em termos de intensidade, quer dos valores absolutos em presença: verifica-se um crescimento médio quadriénio, no período 1996/2008, de +5,66%, com mais 884 votos (mas torna-se negativo entre 2000 e 2008, com -3,56% e menos 436 votos). - E finalmente, temos 2004, e o que sucede nessas eleições é, a meu ver, fundamental para perceber o que se tem vindo a passar eleitoralmente nos Açores, de 1996 a esta parte. As lições de 2004 podem vir a verificar-se incontornáveis para perspectivar o que pode suceder em 2012.
2004 é o ano do "efeito Victor Cruz". O "efeito Victor Cruz" foi suficientemente forte para convencer o seu partido e a comunicação social (regional e continental - ver aqui) da vitória da coligação PSD/CDS; e esse efeito foi suficientemente credível para mobilizar o eleitorado, que não queria (receava) a vitória da coligação, a votar no PS.
É bom não esquecer, em prol da boa análise, que 2004, é o ano do voto útil e da efectivação do potencial eleitoral do PS - acrescido, no entretanto, ao logo dos 8 anos da governação socialista. O PS ganha em 2004 em relação em 2000 e a 1996, mais 10.695 (+21,63%) e 8.227 votos (+15,84%), respectivamente; à esquerda do PS, o voto útil - o "efeito Victor Cruz" é, efectivamente, credível - é patente: o PCP perde, em relação a 2000, 1.888 votos e o BE, 368 votos.
A coligação PSD/CDS convece o eleitorado de ser uma ameaça séria à governação socialista, mas perde as eleições e 3.365 votos em relação ao voto agregado que o PSD e o CDS obtêm em 2000. Se bem me recordo, na altura terá sido dito que a coligação tinha sido castigada pelo eleitorado tradicional do PSD que não teria gostado da solução - contudo, a descida do PSD manteve-se em 2008, sem a coligação.
Os resultados de 2008 têm de ser vistos dentro deste quadro. Em 2008, não havia uma ameaça credível ao PS e à sua esquerda desapareceu o voto útil, e parte do seu eleitorado não votou - não vislumbro qualquer motivo significativo de desagrado por parte do eleitorado para motivar uma abstenção militante contra o PS. No entanto, a abstenção mostrou-se efectivamente perigosa para a sua maioria absoluta (não sei o limiar, e em que ilhas, onde a abstenção do eleitorado potencial do PS pudesse ter conduzido à perda da maioria absoluta).
Em 2012, o PSD irá apresentar de novo um candidato forte e credível. Mantendo-se o quadro de parâmetros e de restrições onde se movimenta a sociedade açoriana; na ausência de disparates por parte do PS na determinação da sucessão de Carlos César - que este irá evitar a todo o custo -, não pode arredar-se a possibilidade do PSD ter uma nova versão do "efeito Victor Cruz", agora com Berta Cabral.
Naturalmente, o resultado final em muito irá depender do modo dos intervenientes e da circunstância dos eventos, mas nada justifica invocar os resultados destas eleições para fundamentar um "eventual" fim de ciclo para o Partido Socialista.
Irei regressar a esta matéria.
PS(08.11.03): Duas adendas:1) a evolução da estrutura do peso relativo da votação dos partidos - não a tinha calculado antes - sustenta aquilo que é dito acima (ver de novo aqui);
2) Paulo Portas, em declaração no AO de 26 de Outubro passado, diz, em relação aos resultados do CDS, que "de 3,9 por cento passou para quase 9 por cento" - não sei donde sairam os 3,9 %: não os descubro em lado nenhum!
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